Wednesday, June 27, 2007

Vai meu Irmão

É 64. O canhões estão na rua. Tanques circulam como taxis. Homens de capacete e farda tomam os principais locais do país. No Rio, patrulhas caçam. Em São Paulo, já estão nos calabouços. Estudantes correm sem direção. O Congresso e o Senado estão fechados. Entre “twist and shout”, do reis do ye-ye-ye, ouve-se tiros de fuzil. Esta instaurado o período ditatorial mais longo da história nacional.
Durante esse vinte e poucos anos, muita coisa aconteceu. Uma das grandes coisas, foi perder a chance de transformar o que era a esperança e o sonho, ou então a “bola da vez” chamada Brasil, para ser a “bola do jogo”. Sair do jargão “país do futuro” e fazê-lo presente. Os militares jogaram a melhor chance que tivemos. Nesse período de perseguições, torturas e mortes, tiveram também fugas. Quem pode correu, quem não pode... Formaram-se os grupos dos exilados políticos espalhados pelo mundo. Por todo canto encontrava-se um brasileiro, por ai, despatriado. Expulsos de seu país para poder viver.
Mas passaram-se já vinte anos da abertura política. 40 do início da Ditadura. O país vive ainda em um caos. No Rio, estão quase implorando para os tanques voltarem às ruas. Em São Paulo, há muitos em calabouços, não mais do DoiCod, mas do PCC. O Congresso e o Senado estão abertos mas vivem vazios, e mesmo quando cheios, não servem para nada, só aumentam as crises e escândalos. Os estudantes já não correm e nem tem porquê, já que não tem inimigo declarado e comum, e muitos inimigos são amigos do ponto. Estudantes não sabem para onde ir, já que caminho e perspectiva não se tem. Não temos mais os Garotos de Liverpool. Tivemos as bundas de Carla Perez, e algo pior virá. Faz vinte anos que a mais porca democracia esta instaurada, talvez menos mal.
Mas tem também os exilados. Exilados como eu, por opção. É um fenômeno latino-americano-brasileiro. Quem pode, sai. E não pensem vocês que são pessoas com a corda no pescoço não. Vejam que entram nessa lista até os boleiros milionários, como Ronaldo e Ronaldinho. Tem um êxodo agora para a NBA. Os astros se mandam antes. Tem também aquele grupo da média e alta gerência que pedem transferencia. E tem os como eu.
4 milhões partem todo ano para a romaria de viver sobe outra bandeira1. O caminho inverso dos colonizadores de 500 anos atrás, ou dos italianos, alemães, japoneses, turcos, árabes que foram ao Brasil em busca de alguma coisa muito parecida com esses 4 milhões.
Cada um tem o seu motivo, a sua justificativa, a sua história. Mas o objetivo é sempre muito parecido: tentar o que parece ser impossível na terra natal. É claro que isso mostra que existe alguma coisa não muito certa, mesmo porque, esse número são de pessoas que saíram oficialmente. E nem entramos no mérito dos que querem, mas não podem ou não vão.
Outro dia disse a um famoso jornalista: “... Talvez seja melhor morrer como herói, aquele que morre pelo que acredita, do que viver sem esperança alguma... Faço parte desse contingente, que saiu do país, talvez expulso ou em exílio espontâneo, na busca de um sonho. E eu prefiro morrer tentando, ao viver conformado”
E ele me respondeu: “... Lamento ter que te dizer, que acho que fez a coisa certa...”

Notas”1 - Folha de São Paulo, Editoriais, Clóvis Rossi, 26 Junho 2007
Música: Samba de Orly - Chico Buarque
Por Fernando Flitz Katayama, Toronto, On Canada 27 jun 2007

3 comments:

Duda said...

Também vivi fora do meu ambiente natal, EUA, França, e até o sertão da Bahia eu fui tentanto achar as respostas que todos nós nos fazemos.Será que temos competência para administrar o NOSSO próprio país?Fazemos faculdade, refletimos abrimos mão de nossas verdades, sofremos para nos modificar.Será que um dia vamos fazer com que os 80 de quase analfabetos entendam o que é votar? Ou será que estamos sendo muito ingênuos em achar que o que vemos é a realidade? Não acredito que no Brasil exista mesmo conta de votos.Tudo é comprado e bem planejado. E os "Lulas" são laranjas e fantoches legais e presidenciais.
Proponho um novo ministério .Algo que não nos permitem ter. MINISTÉRIO DA VERGONHA E MEMÓRIA NACIONAL.

C. Buratto said...

Tenho um certo pudor em criticar o Brasil porque na verdade nunca fiz nada ativamente para mudá-lo. Não deu tempo...fui embora muito cedo. Nem procurei a oportunidade de fazer algo por ele, por nós. Só por mim: salve-se quem puder, mas nao basta. A minha não foi um escolha política, não sei nem se tenha sido escolha ou destino mas estou correndo o risco de ficar sentimantal!!!
Tudo o que foi dito é verdade, cada um a sua verdade relativa, a sua experiência à flor da pele. Mas vamos deixar a democracia num pedestal. A nossa liberdade atè de escrever num blog. Tudo isso por profundo respeito à quem lutou por ela.
Obrigada pela musica da semana!

MKT said...

É Flitz, é por aí.. Muito bom este texto.

Abraço,

Renato
www.torontoconnection.blogspot.com