Fui à feira no último sábado. Essas feiras de rua, tradicionais em cidades do interior, aqui na minha cidade, ainda existem algumas. Lógico que estão perdendo espaço para os hipermercados e tudo mais, mas ainda resistem bravamente à mudança. Logo pela manhã, bem cedinho, começam a chegar os caminhões Mercedes Azul, 78, abarrotado de coisas. As barracas surgem com o sol. Fui à uma dessas. Tradicional aqui da cidade.
Tem pastel do japonês, o doce de leite de panela, o tomate do seu Zé... O cheiro, a rua, os feirantes, me fazem lembrar da minha infância, quando eu acordava cedinho para ir passear na feira, e ajudar minha mãe, nas compras de casa. Morava à apenas uma rua.
Certa vez, fui comer pastel lá. Era bem cedinho e estava saindo de uma noitada com um amigo e um ex-caso meu. Acabei experimentando uma fruta. Aspecto estranho. Cor verde. Meio feia. Polpa branca e substanciosa. Gosto azedo-doce e delicado. Muito saborosa.
Estou falando da fruta, sem malícias, caros amigos.
Mas eu disse que tinha ido à feira no último sábado, não é?! Pois é... Fui à barraca do simpático feirante, que havia me dado o prazer de conhecer aquela fruta. Voltei lá pra comprar umas duas... Mas infelizmente ele não tinha mais. Como tinha ido lá especialmente para comprar a deliciosa atemóya, voltei para minha casa, um tanto decepcionado, afinal, queria a atemóya, e não banana, abacaxi, laranja... Essas frutas tinham lá.
Voltando da feira, comprei um jornal. Desses de circulação nacional e grande prestígio. Afinal eu não iria comer mais a atemóya e não queria voltar de mão abanando. Chegando em casa, logicamente, passei um café, meu fiel companheiro das leituras dos meus jornais. Entre uma página virada e um gole, li uma notícia sobre a nossa crise política atual.
A reportagem era sobre o benefício que essa crise pode trazer ao país. Sim, benefício. Era sobre a reforma do sistema político nacional, falido e corrupto.
Tenho que concordar com a reportagem. Pode ser que essa crise traga ao país mudanças no sistema. Algumas propostas já estão sendo formuladas. Redução do tempo de campanha. Algumas novas normativas. E uns outros blá blá blás.
Parece que agora a culpa é da campanha e do tal marketing político. Mas não é. O buraco é bem mais embaixo. As falcatruas usam os orçamentos milionários para desvios de verbas e tudo mais. Isso nem é lá uma grande novidade. Afinal como disse nosso Presidente: “caixa dois é pratica”.
Vou falar um pouco de marketing para que vocês vejam como é que funciona o nosso sistema! Nós, estrategistas de marketing, trabalhamos com dados e números que surgem através de pesquisas. Precisamos saber onde é que tem o que, e se queremos ou não isso ou aquilo. Então traçamos planos e ações para chegar nos nossos objetivos. É muito bonito. Usamos tudo que esta disponível, e logicamente, com ética, seriedade e honestidade.
Mercado também é estabelecido por nós e denominamos de: mercado total, potencial, disponível, qualificado, alvo e penetrado. Para facilitar, faça um circulo dentro do outro e vá colocando os nomes, comece do mercado total, o maior e na seqüência, faça sucessivos círculos circunscritos, até que acabem todos os níveis.
Vocês devem estar pensando, com uma certa cara de ué, onde é que eu quero chegar com isso e o que e o que tem haver marketing com a nossa crise e a reforma do sistema eleitoral.
Simples.
Quando é que o IBEGE faz o senso? Alguns anos antes das eleições? Pronto, determinamos com pesquisa, o nosso mercado. E à partir daí é muito fácil segmentar o mercado. Olhe para os círculos que fez. Será que com o senso, nós não sabemos exatamente se você tem 1 ou 2 carros na garagem? Se tem televisão? Número de pessoas? Escolaridade? E tudo mais?
Semelhança ao mercado total? Potencial? Disponível? Qualificado? Alvo e penetrado? Podemos ir mais fundo e saber das suas necessidades! Incrível! Clap clap clap, palmas para nós, pessoas de marketing.
Agora em um sistema eleitoreiro como o nosso isso é extremamente importante para definir as estratégias à serem usadas. Mas isso tudo tem como ser diferente.
Hoje nós somos obrigados a votar. É impressionante em um país democrático, ou que pelo menos se diz, que o direito seja um imposto. É direito seu, e use-o quando quiser, se quiser.
Algumas pessoas dizem que é nosso meio de dizer o que pensamos. Concordo. Mas tem pessoa que não pensa ou que não quer se manifestar, mas em nosso sistema atual, são obrigadas. E não pensem vocês que não há punição a esse ato de rebeldia. Como na ditadura, há punições. E o Brasil é um país democrático, vejam só.
Como somos obrigados a votar, facultativo só para adolescentes, que têm a responsabilidade de escolher o caminho da Nação, mas não podem ser julgados por seus atos como adultos responsáveis. Os jovens representam uma fatia grande da população. Aumentaram o mercado. Como somos obrigados, fica mais fácil fazer a campanha, já que sabemos exatamente quem é que vota.
E o que era direito do cidadão passa a ser obrigação.
E se votar não fosse obrigatório? Ai as coisas, meu amigo, iriam mudar de figura. Votariam somente as pessoas que querem votar e têm convicção dos seus atos. Porque estão decididas. Porque conhecem as propostas, não só para aquela campanha, mas a proposta do partido. Não votariam somente na figura representa de um ou outro candidato, porque só ele, não governa. É preciso ter a base e tudo mais, votariam na conscientemente nas propostas e ideologias do partido.
As campanhas teriam que mudar radicalmente o discurso, porque agora teriam que convencer pessoas que estão interessadas na política, não adiantaria ficar fazendo palanque, chamar Xoraõnzinho & Cornudão para fazer showzinho em praça pública. Não adiantaria contratar os boca de urnas. Não... Teria que ser muito mais convincente.
Eles não conseguiriam determinar exatamente o mercado votante, como fazem hoje.
E você não teria que optar pelo menos ruim. Menos ladrão. Ou com menos dedo, afinal com menos dedo a impressão que dá é que cabe menos na mão. Grande erro.
Como eu que lá na feira, que não quis levar nem o abacaxi, nem a banana, nem a laranja. Eu queria a atemóya e pronto! Não comprei nada e fui embora.
Hoje, tem gente que, mesmo não querendo, comprou Lula e está agora, engolindo o sapo.
Por Fernando Katayama 25 Agosto 2005
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