Thursday, May 18, 2006

Show da Malandragem

Meu vizinho peida alto. Parece um tiro de metralhadora ou uma granada de mão explodindo. Em dois minutos os bombeiros já chegaram e junto com eles, uma frota de carros da polícia, inclusive uma “task force” da SWAT. Os caras aqui são neuróticos e estão paranóicos com essas coisas de ataques terroristas que qualquer peido é bomba. Mas é evidente que os organismos públicos funcionam, afinal o caminhão dos bombeiros chegou em dois minutos.
Não sei quanto tempo leva no Brasil. Nunca tive um vizinho que peidasse tão alto. Contudo eu sei que tem uma organização que funciona muito bem.
É o PCC.
Os ataques que o PCC executou em São Paulo durante essa última semana, mostrou a organização, já não mais na fase embrionária, mas em estágio avançado. Ataques terroristas simultâneos, primeiramente as forças de segurança e depois aos transportes e por fim, a sociedade civil.
O PCC mostrou-se forte. Uma facção com interesses ilícitos, que hoje, mostrou poder controlar o país. Os ataques só deram um tempo, porque o governo fez um acordo. É um grupo terrorista como ETA, IRA ou Al Quaeda, a grande diferença é que seus líderes estão presos. Irônico. Na prisão estão protegidos de serem mortos por adversários do crime. E nós pagamos a conta.
Porém, os ataques surgiram de forma aparentemente inusitada, sem motivo algum. Imaginemos que sim, foi assim. Então mostrou o governo, tanto estadual como federal, totalmente despreparado, sem o Serviço de Inteligência que funcione, sem polícia que funcione. Mostrou que os bandidos são muito mais eficientes e organizados que a máquina estatal.
Outra coisa que é evidente é o poder da mídia em disseminar a paranóia e aumentar o caos. Lógico que o poder da mídia mal feita previamente calculado pelo cérebro malandro.
Contudo não deixo de pensar que nada disso foi assim, ao acaso. Bandido não gosta muito de alvoroço, porque prejudica os negócios. Bandido não gosta de polícia no pé. Prejudica os negócios. Bandido gosta da sombra e da escuridão, nada de holofotes e exposição. Prejudica os negócios. Porque então cargas d’água fizeram esses ataques?
Pra mim, tem jogada política. As eleições se aproximam e com o medo da população, o tal clichê de campanha “mais segurança”, torna-se mais poderoso agora. Quem mostrar que controla a violência urbana, terá mais pontos. Na última eleição, a população engoliu o grande engodo do Fome Zero, e agora cospe no prato que comeu, e ainda passa fome.
Por um outro lado, volto a repetir, porque já disse em um texto antigo, que país com o caos instaurado é prato feito para golpe militar. [ver Homens-folha, 16 de maio de 2006]
Agora vai começar a ladainha de “mais segurança para a população” e blá, blá, blá. Vesgos, não conseguem ver direito sem óculos. É preciso colocar óculos na sociedade, para parar de exigir “mais segurança” e começar a exigir mais educação, mais seriedade e menos corrupção. Corrupção não só do governo, mas das pequeninas corrupções que acontecem no dia-a-dia de cada um.
Se não, não sobra muito o quê fazer. Para aqueles que acreditam que rezem, e rezem mais ainda para não acabar a vida ouvindo Ezekiel 25.17.


[música do texto: 01 - Pumpkin and Honey Bunny, Misirlou – Dick Tale e His Del-Tones; 02 - Ezekiel 25.17 – Samuel L. Jackson / Pulp Fiction, 1994]

[PCC – Primeiro Comando da Capital, facção Criminosa, executou ataques terroristas no Estado de São Paulo durante a semana de 7 a 17 maio de 2006, e que ate agora, resultou em mais de 100 mortes, entre policiais, criminosos e civis]

[Ezequiel 25.17, é um trecho do filme de Quintin Tarantino, Pulp Fiction, 1994, que Vincet Veja (John Travolta) e seu comparsa Jules Winnfield (Samuel L. Jackson) matam outro criminoso, mas antes disso, Jules recita Ezequiel 25.17]

Por Fernando Katayama, New York, NY, May 18 2006

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