Friday, May 30, 2008

Cá e Lá

O frio na barriga estava comigo. É sempre assim, nesse hiato entre lá e cá.
Cheguei lá. Disseram-me que estava frio. Eu suava.
Deveria ter ido de chinelo e bermuda. O casaco já fora esquecido na mala. Para mim estava quente, mas vi gente de casaco de inverno.
Estranhei o som na rua, e me senti estúpido. Era um sujeito qualquer falando português. Fiquei meio confuso, mas talvez tenham sido os perfumes que cheirei, no mercadinho do aeroporto.
Foi assim que cheguei de volta ao Brasil. Depois de alguns anos, pisei na Terrinha.
Dessa vez não foi suficiente, o tempo foi muito curto para tudo que precisava e queria fazer. Tive que optar, e optei por fazer o que dava, sendo essa a minha única opção.
Mas pensando bem, o tempo nunca será suficiente. É como quando vamos viajar para algum lugar, e sempre tem uma ou outra coisa que não deu para fazer ou ver, ou aquela preguiça de voltar a rotina, e querer ficar sentado à beira da praia com os pés no mar, dizendo estar vendo o por do sol, mas na verdade estamos vendo mesmo são as mocinhas correndo no final de tarde. Sempre digo que essa é a melhor desculpa para voltar: deixar algo por fazer.
Mesmo assim, quando cheguei, parecia que tinha estado lá, ontem. Mas não foi. Fazia tempo que não pisava lá.
Fui paparicado por mamãe. Tive que maneirar na comida, já que tudo que eu gosto, estava lá, na minha frente. Andei pelo jardim, e relembrei da minha infância em casa. Parece que quando estamos longe por tanto tempo, essas lembranças voltam mais fortes.
Vi meus sobrinhos pequeninos e sorridentes. Conversei com minha irmã. Fomos ao shopping, e ela sentiu-se a mãe mais orgulhosa do mundo, a cada elogio aos gêmeos que estavam nos meus braços. E é engraçado carregar neném no colo, a gente faz careta, baba, fala mole, e se esquece que todo mundo tá olhando para você, com cara de bobo.
Dei risada com minha tia-avó, já tão velhinha, mas com seu humor sarcástico e irônico.
Revi pessoas queridas, que entram em nossas vidas meio sem querer. Tomamos café.
Revi alguns poucos amigos do coração. O tempo foi suficiente para um forte abraço e um beijo, mas insuficiente para colocar a conversa em dia. E infelizmente não consegui ver todos.
Separei um tempinho para ir aos bares que gosto. Afinal, neles escrevi muitas das minhas histórias. É muito bom ser relembrado por todos lá.
E no meio disso tudo, também conheci gente nova. Gente bonita e de bom papo.
Mas sempre tem a hora de ir embora. É a hora que se pensa em ficar.
É a hora que dá aquele gostinho de quero mais. E é nessa hora que ponho a saudade de lado e a deixo lá. E entro no avião já esperando o próximo frio na barriga


Por Fernando Flitz Katayama, Toronto, On Canada 30 May 2008

Tuesday, May 06, 2008

Férias em Casa

Lembro da primeira vez que tomei um avião. Eu era pequeno. Sentei ao lado de meu pai. Naquela época ainda podia-se fumar na cabine e os talheres eram de metal. Não sei ao certo para onde íamos e realmente pouco importava, estava em um avião. Sentei na janelinha e vi as coisas diminuírem até que as nuvens apareceram. E foi emocionante.
Lembro também, que anos depois, iria sair do país pela primeira vez. Iria de PanAm. Norte-América me aguardava e ficaria um tempo na casa do meu grande amigo.
Era a aventura de ir sozinho para terras desconhecidas, de idioma estranho e mulheres sem bunda e de peitão. Não sabia como seria, não tinha idéia, mas sabia que seria uma aventura bacana. E foi.
Depois fiz muitas outras viagens pelo mundo. Rodei a Europa de mochila. Eu e minha irmã levantávamos o dedo, e pra onde soprava, era para lá que iríamos. Conhecemos pessoas no percurso, que nunca mais vimos. Conhecemos um monte de lugares, e logicamente um monte de fotos e histórias. Fui outras vezes ao velho continente e a América. Fui ver o primeiro raio de sol lá no Japão e vi o sol da meia-noite na Suécia.
Minhas férias eram gastas rodando o mundo fora de casa. Acabava uma viagem, pensando já, na outra. Férias são para isso. Ir conhecer coisas e expandir o conhecimento e a cabeça. Ir sempre para algum lugar diferente, voltar e ter um monte de coisa para contar.
Férias...
Agora alguma coisa mudou. E mudou muito. Estou saindo de férias, apesar de ser curtinha, de 7 dias, são férias. Não vou a um lugar desconhecido. O idioma é o meu. Os costumes eu já sei. Sei o que vou pedir para comer. As mulheres terão bunda, e algumas já mandaram por o peitão. Será tudo diferente das férias que tive.
Vou de férias de volta para casa. Parece ser estranho dizer que, suas férias serão de volta para casa. Mas isso é um fato de quem não mora mais onde nasceu.
Hoje, ir de volta pra casa é a aventura de rever a mãe, de ver quem você nunca viu antes, mas já os conhece. É a aventura de rever os amigos e saber das histórias que você não sabe. De contar as aventuras que teve. É ir de encontro ao novo-conhecido.
Mas mais que isso é ir de encontro com tudo aquilo que você deixou para trás. De balançar ao ver tudo aquilo junto. De pensar na vida e gastar uns segundos, perguntando-se se você fez ou não certo, sabendo que essa resposta não existe. Ir de volta pra casa é tão emocionante como a minha primeira viagem de avião.

Notas: Faz tempo que não volto para “casa”. Desde que sai, há 2,5 anos é a primeira vez que volto.
Música: Mudaram as Estações - Cassia Eller
Por Fernando Flitz Katayama, Toronto, On Canada 06 May 2008