Tivemos uma festa para comemorar os dez anos de formados da turma RA 92. Foi em setembro e eu não pude ir. Recebi as fotos, reconheci rostos e outros nem idéia de quem são os donos. Notei a diferença entra as festas daquele tempo e a de hoje. Tinha muito mais latinhas de Guaraná que de cerveja.
Bateu o saudosismo. Comecei a lembrar daquele tempo. Bom tempo de faculdade. Tempo de festas loucas, churrascos de meio de tarde e encontros em botecos. Tempo também da ingenuidade, dos sonhos, da vontade de revolucionar o mundo.
Era 92 e era tudo novo naqueles prédios velhos da Escola. Para nós, “bixos” muita ansiedade e expectativas, daquilo deveria ser a realização do sonho do vestibular. Tínhamos estudado muito para passar na maldita prova seletiva. Além disso, a entrada na faculdade marcaria para sempre a mudança entre os meninos do Colégio e os homens da Faculdade. A fina linha entre uma coisa e outra.
Em 92, não tínhamos mais um inimigo em comum como nas histórias que ouvíamos de 60 e 70. Não tínhamos mais que lutar contra o regime. Qual era a divisão entre o bem e o mal, então?
Nós ainda sentíamos os resquícios da Ditadura que tomara o país por longos 20 e tantos anos, sentíamos também o pesado período da hiperinflação. Mas mesmo assim não tínhamos nada para ir contra, com a bandeira em punho, marchar para à luta.
Nada disso. Nós estudantes da Puccamp, classe média, para não dizer, alta, havíamos estudado a vida toda em escolas particulares e feito cursinho para a faculdade. Tínhamos uma vida relativamente tranqüila.
Era um tempo sem grandes ídolos. Sem grandes referências. E havia uma mescla total não só de estereótipos, mas de sonhos e convicções. Alguns ainda viviam no passado e eu os apelidei de neohipies, porque ainda pensavam estar no clipe de Woodstock. Outros eram totalmente alienados com o mundo ao redor. Alguns outros, simplesmente eram conformados. Mas não a turma de ’92, essa queria mudança.
Como não tínhamos mais um inimigo clássico, lutávamos para que nosso mundo fosse melhor. Queríamos que as aulas começassem no horário e acabassem na hora prevista. Queríamos melhores mesas para estudar. E acreditem, queríamos computadores!
Nossas idéias de vanguarda eram sempre arrebatadas por discursos desanimadores dos nossos veteranos. Não importava, continuamos a buscar o que queríamos.
O Centro Acadêmico em 92 estava fechado. Ninguém queria o queria mais. Em 93, quando um grupo resolveu tomá-lo e reabri-lo, fumavam “o fininho” e falavam de festas. Ou então, atacavam o reitor, contra o único inimigo que existia, a mensalidade da faculdade. Com o discurso retrógrado, pregando o comunismo marxista que anos antes acabara de cair com a Perestroika.
Eu era contra isso e achava a maior babaquice. Sempre fui careta e nunca fumei, nem do fraco nem do forte, e o meu posicionamento político-econômico já estava mais para liberal que comunista. Lembro de um dia que fomos tirados da aula, para discutirmos em assembléia, a mensalidade, o grande vilão. O Centro Acadêmico estava cheio, quando o presidente começou o discurso. “A mensalidade já é cara, e o aumento este mês foi abusivo, vamos fazer uma greve”, e acabou! Não durou cinco minutos. Pensei: “ótimo vamos voltar pra aula!”. E o presidente: “agora vamos falar de coisa legal, vamos falar de festa!”. Fiquei puto e gritei: “porra, você me tira da aula que custa uma fortuna, para falar de festa? Faz isso no intervalo!” – a partir desse dia, fui odiado! Passei a ser o cara que não era a favor da Causa, da universidade para todos e de graça, o babaca que vai contra a massa, contra a manipulação.
Teve a fez que resolveram fechar a rodovia próxima a faculdade... Eu já odiado pensei: “que merda! O que é que o cara lá na rodovia tem com os nossos problemas”, já era odiado suficientemente, resolvi ir embora e não abrir a boca. Era a ditadura estudantil, querendo se impor pela força e pelo não discurso, e pensavam estar fazendo “tudo para todos”, com uma superdemocracia, e hoje criticam Bush. Como disse no início, era tempo de muita ingenuidade.
Mas nós, a turma de 92, melhoramos o nosso mundo. Hoje, as aulas têm hora para começar e acabar. E acreditem, eles têm computadores.
Hoje tudo mudou. Não temos mais a ingenuidade, envelhecemos. Lutamos cada um por si, em busca da própria felicidade. Cada um cuida do próprio rabo, e de vez em quando, nos reunimos para contar e relembrar os casos do passado.
E talvez essa seja a melhor maneira de contribuir com o Mundo todo, fazendo o nosso mundo, melhor. Assim como fazíamos em 92.
[música do texto: Beatriz – Ana Carolina e Seo Jorge, para relembrar os dias de barzinhos e MPB]
[RA 92, é o número inicial de nossas matrículas, essa turma formou-se em 96, e alguns em 97, 98, 99...]
Por Fernando Katayama New York, NY, 17 out. 06
1 comment:
Pronto!! Consegui colocar o link do seu blog sem ferrar o layout! =)
Abraços!
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